quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Onde vai parar a brincadeira?

"Nem me pega, lero, lero lero!", se você já foi criança - e eu sei que foi - certamente entoou exaustivamente essa frase ou a ouviu diversas vezes dos “coleguinhas”. Dita em tom de ameaça, não passa de uma brincadeira infantil, mas é na infância onde a personalidade é edificada. E o que antes seria uma espécie de fuga de uma pessoa querida, esperando que ela corresse para lhe pegar, tem um significado amplo no âmbito social adulto, atuando como uma constante nas relações afetivas.

Aquela sensação de estar sendo buscada, solicitada ou disputada é sempre vista com bons olhos pelos adultos que já deveriam ter passado da fase do "nem me pega", mas que, ao contrário disso, não conseguem escapar ao uso de uma égide para se precaver das armadilhas de um possível envolvimento. Pessoas que são inseguras, que trabalham, constroem o sucesso profissional, mas, muitas vezes, são incapazes de erigir a autoconfiança necessária para desapegar-se dos atributos intempestivos de esconde-esconde e pega-pega. O fato de alguém fugir, ou se esconder, para sentir-se estimado apenas ratifica a fragilidade de homens e mulheres que estão se perdendo uns dos outros devido às suas próprias carências que não conseguem ser supridas pela débil propriedade do “lero, lero, lero”.

Fugir de relacionamentos é a maior prova de que alguém tem necessidade de se auto-afirmar e por isso evita se envolver com alguém que não venha a lhe acrescentar em auto-estima. Essa necessidade que as pessoas têm de trabalhar o ego a partir dos relacionamentos traz consigo uma doce ilusão de que para ser feliz em toda a sua plenitude é necessário ter pessoas ao seu redor o tempo todo lhes elogiando, dizendo o que anseiam ouvir e, pior ainda, sendo falsos e dissimulados. Armadilhas à vista, pois geralmente pessoas do tipo “melhor-amigo-à-primeira-vista” têm uma capacidade incrível de abster-se do sentimento alheio quando encontram a primeira oportunidade de passar a perna em outrem.

É preciso muita cautela no tipo de relação, seja afetiva ou amorosa, em que se busca no próximo um ponto de equilíbrio do próprio ego. Afinal, estou certa de que ninguém vai querer provar do sabor amargo de se entregar a uma afeição e em troca ouvir, pairando no ar, aquela velha frase: "enganei o bobo na casca do ovo".

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O dia em que eu não passei no vestibular

Atualmente eu estou cursando Direito na UFCG, mas não estava nos meus planos largar minha cidade e Estado pra estudar fora de casa. Isso porque na minha cidade tem uma universidade federal com o curso de Direito, a UFRN, e era nela onde eu pretendia estar hoje. Mas, como eu bem sei, as idealizações têm mania de cair em meio ao vão. Ironias do destino me fizeram deixar minha mãe, que precisa da minha companhia, morando só, pra morar com alguém que não me suporta - e a recíproca é verdadeira em ambos os casos.

O dia em que eu não passei no vestibular da UFRN foi terrível. Me faltou o chão, o ar, a vontade de aproveitar o dia de verão que estava à minha frente. Eu recebi a notícia por telefone, e lembro muito bem da frase que ouvi do meu primo: "Chorinho (apelido de infância), seu nome não tá na lista..." E nesse momento me deu vontade de pedir pra ele olhar melhor, pra ver de novo. E de novo. E outra vez. Até que a realidade me atingiria como uma bala de canhão: eu não passara. Mas eu não pedi, eu apenas agradeci por ele ter olhado o site pra mim. Minha mãe estava ao meu lado e deu pra sentir pela minha falta de empolgação que o resultado fora negativo. Ela ficou triste, mas não mais que eu. E ela foi até compreensiva, sabia que eu havia perdido dois meses de aula por causa de uma cirurgia e que isso me atrapalhou um pouco. Mas era minha obrigação ter passado, e essa constante ficou pairando no ar o dia inteiro. E pelo resto do verão, enquanto não saiu o resultado da UFCG.

No fundo, eu sabia que não havia estudado o suficiente. Na verdade, eu pouco havia estudado, mas ao menos frequentava as aulas e prestava atenção em algumas delas. Bem, seja lá como for, eu acreditava que ia passar e fiz minha mãe acreditar nisso também. O churrasco estava preparado, era quarta-feira do mês de janeiro, e o pessoal da família tinha ido de Natal pra praia pq era um feriado. A cerveja estava gelando, a churrasqueira pronta pra assar a carne, e as mesas e cadeiras postas na grama de frente ao chalé. Não tivemos o motivo pra comemorar mas, já que estava tudo pronto, houve a "festa" mesmo assim. Eu não sabia se ria ou se chorava, era emoção demais pra um dia só. Guardei o meu pranto pra quando eu pudesse ficar sozinha com meus pensamentos e minha derrota.

Eu tive que ouvir da minha tia que eu nunca quis estudar, e era como se aquelas palavras saíssem da boca da minha mãe que não as pronunciou. E eu não tinha o que dizer, pq eu falhei e não havia justificativa pra isso. Tive que ouvir da vizinha que eu seria bacharela em Direito pq eu não passaria na OAB. Detalhe: nem no vestibular eu havia passado e minha OAB já fora desacreditada. Eu simplesmente retruquei, pensativa: "Vá indo, que eu vou voltando".

Mas algo naquele churrasco me fez refletir sobre o rumo que a minha vida estava levando. Foi quando minha mãe disse a uma amiga: "Ela é muito inteligente, mas nunca quis saber de estudar. Quando era criança só tirava 10 sem pegar nos livros, e no ensino médio ficou em todas as recuperações, só tirava nota 'perdida'. As professoras sempre elogiavam a inteligência dela, mas reclamavam da bagunça e das conversas na hora da aula. Uma vez ela ganhou medalha de ouro num concurso de poesia, e as colegas que eram as primeiras da sala tiraram o segundo e o terceiro lugar. Hoje as duas estão fazendo medicina, passaram no primeiro vestibular."

O pior de ficar pra trás é ver os amigos seguindo em frente e acenando pra nós, mostrando que a vida continua e que é pra frente que se anda. Quanto mais eu pensava nisso, mais triste eu ficava. Foram noites e litros inteiros pra calar o grito que eu não dei e que ficou atravessado na minha garganta. Mas a angústia não perdurou o mês inteiro, porque uma ou duas semanas depois saiu o resultado da UFCG e todo o sofrimento se esvaiu feito fumaça. A partir desse momento o verão passou a ser o melhor de todos e o carnaval, então, nem se fala. E eu prometi a mim mesma que, se eu passasse no vestibular, aproveitaria o ano inteiro pra compensar a humilhação que eu sofri naquele dia em que eu NÃO passei na UFRN.

Aqui estou eu, aproveitando intensamente o meu ano e curtindo a minha vitória, enquanto outros que estudavam comigo e me davam conselhos do tipo "vá assistir aula", ou que faziam perguntars incrédulas do tipo "vc não fez os exercícios?!" tentarão passar novamente no vestibular ou se contentaram em cursar nas universidades particulares da vida. Eles me diziam o que fazer, achando que eu trilhava o caminho errado. Mas o tempo provou que cada um sabe de si, e que o mérito é dado a quem é digno de recebê-lo. Eu nunca duvidei do meu potencial, apesar de ele ter sido diversas vezes subestimado pela maioria.

Sabe aquele velho ditado: "quem ri por último ri melhor"? É mais ou menos isso.

domingo, 24 de outubro de 2010

À vida!



Eu só bebo em ocasiões extremamente especiais. Mas é que, para mim, a vida por si só é a "ocasião" mais extraordinária do universo. Então...


Celebremos à vida!

sábado, 23 de outubro de 2010

Nostalgia: noitadas na calçada

Quando eu era criança minha casa vivia rodeada de amigos dos meus pais e, quando havia festinhas, eu adorava estar entre eles. Eu ficava ali caladinha, ouvindo a conversa dos adultos que tanto me fascinava. Eu adorava as piadas que eles contavam, adorava o modo como eles se divertiam com aquilo: bebendo, rindo à toa, sendo felizes. E eu aprendi a nunca pegar a cerveja pelo meio, para não congelar; e quando congelava, me mandavam alisar o fundo da garrafa. Aprendi o que era uma cerveja "capa branca", e que a saideira nunca era a última cerveja da noite. Depois sempre vinha cerca de três "expulsadeiras". Aprendi que quando a espuma era demais, e ia derramar no copo, bastava colocar o dedo que ela baixava. Eu aprendi também a mexer no som para comandar o repertório da turma e poder cantar com minha mãe: "Eu lembro da moça bonita da praia de boa viagem..."

Eu me divertia na noite de Natal acordada até a hora em que eles ficavam na calçada, e ouvia sempre a mesma pergunta: "Menina, você não tem sono, não?", mas eu não tinha. Eu trocava qualquer sono por aquela mesa rodeada de amigos dos meus pais. No reveillon eu amanhecia o dia na calçada e ainda acompanhava minha mãe até alguma outra casa onde a farra continuasse rolando. Porque depois que meu pai partiu para um plano superior (isso faz parecer menos triste do que de fato é), eu passei a ser a companheira da minha mãe. Jantares, aniversários, festinhas, ela me levava a todos os lugares como sua fiel escudeira. E eu sempre lá, ouvindo a conversa dos adultos, ouvindo e adorando tudo.

Talvez de tanto conviver com pessoas mais velhas e por gostar de ouvir suas histórias, eu tenha crescido com uma cabeça à frente do meu tempo. Não por mérito próprio, mas a vida me obrigou a isso. Me fez amadurecer cedo demais, enfrentando uma grande perda precocemente e tendo lutado para viver logo após nascer.

Hoje eu participo de farras no mesmo estilo com os meus amigos, e me divirto muito. Adoro tudo isso! Mas, não sei porque, acho que nada se compara àquela felicidade que eu tinha de ficar na mesa dos adultos ouvindo e observando a tudo. Acho que eu admirava toda aquela alegria e queria também participar das mesmas emoções um dia. Esse dia chegou (um tanto antes da hora), mas nada consegue superar aquelas noitadas na calçada, que aconteciam quase toda sexta-feira. E tomara que algum dia eu me sinta tão realizada com os meus amigos como eu me sentia com os amigos da minha mãe. Tomara.

"O que você quer ser quando crescer?"

Eu não sei o que quero ser quando crescer, e acho que tenho medo de descobrir. Porque me amedronta o fato de que, na verdade, talvez eu nunca chegarei a saber o que eu quero ser, porque "ser" é uma carga imensa de responsabilidade. Para ser é preciso entender, sentir, dominar, transmitir, julgar... e mais uma infinidade de atribuições que são necessárias para ser alguma coisa. E talvez eu me contente com a hipótese de desejar ser algo e me esforçar para isso. Ou não.

Um sábado chuvoso

Impressionante a magnitude de um sábado chuvoso. A vontade de ficar juntinho de alguém, e apenas isso. Sem ter que explicar ou se explicar, só ficar juntos em silêncio. Como se os dois juntos se bastassem.


Hoje é sábado, chove lá fora. E nesse momento a minha melhor companhia são os livros.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Antes de mudar o mundo

Sabe aquela vontade de mudar o mundo, típica de jovens revolucionários? Eu a possuo. Mas confesso que, além de mudar o mundo, queria muitas outras coisas. Eu queria ser completa, jogar pôquer e fazer dieta. Queria saber fazer contas de cabeça, queria ouvir Piaf, queria ser amiga de Wood Allen. Queria também o senso crítico de Jabor, além do poder da oratória de Hitler e a postura de Ellen Gracie. Queria escrever poesia como forma de enfeitiçar, queria dominar a melodia. Queria ver o mundo por cima de um Louboutin, queria voar num imenso tobogã. Queria ganhar um Nobel, ser notada e anotada. Aplaudida e ovacionada. Queria publicar artigos, impressionar e orgulhar os meus velhos amigos. Queria trabalhar pra Chanel, casar com Hegel e morar em Paris. Queria tocar piano e conhecer todas as sinfonias de Beethoven, apreciar música clássica. Queria ser juíza e ter autoridade, ser PhD e não perder a humildade. Queria saber tudo de história, queria contar ao mundo um pouco de Cleópatra, César e Carlota Joaquina. Queria discutir política com Freud, deixá-lo de cabelo em pé. Queria saber cozinhar, fazer grandes jantares ao som de bossa nova, apreciando um bom vinho. Queria entender a física e explicar porque o tempo no espaço passa mais devagar, e porque a estrada reflete as nuvens do céu. Queria ter a voz de um sabiá, queria compor pra então cantar. Queria ser a Sofia de Jostein Gaarder, a menina má de Mario Vargas Llosa. Queria arrebatar corações, despertar amores e paixões. Queria viajar o mundo de ponta a ponta, absorver um pouco de cada cultura. Queria bater um papo com Nietzshe num café, poder cumprimentá-lo de pé. Queria dizer umas verdades a Kelsen, que a sua teoria pura do Direito já não é tão pura assim. Queria ser vizinha de Anna Wintour, e escrever uma coluna na VOGUE. Queria ser política e levar multidões às ruas pra me ouvir discursar. Queria ter um cachorro que fosse meu melhor amigo, eu te ofereceria abrigo e ele, a mim, proteção. Queria falar inglês, alemão, espanhol e francês. Queria ser a reencarnação de Jackie Kennedy Onassis. Queria compreender o incompreensível, aceitar o inadmissível. Queria uma infinidade de coisas. Mudar o mundo é apenas uma delas...

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Intensamente

Tudo o que eu sinto é intenso. Tem cor, tem energia, tem sabor. Som e luz. Quando deixo passos marcados, eles mantêm o compasso. Tudo é muito, tudo é excesso. Alegria demais, dor demais. Amor demais. É como se não houvesse meios termos, meia luz, furta-cor. É como se só houvesse calor. Até mesmo o que é frio se faz quente. Não preciso que ninguém me complete, porque eu estou cheia, quase derramando. Preciso dividir tanta essência com alguém.


[Que me queira um bem...]

Amor pro-(l)ibido

Essa paixão é proibida, menino.
Ninguém nos perdoaria,
Ninguém nos entenderia.

E se os outros soubessem,

Eu não te amaria.
Porque você pra mim é canção,
Fuga da idealização.

O nosso amor é entorpecente,
É chama forte, ardente.
Tem pele e cheiro,
É amor por inteiro.

Mas não posso me dar ao luxo
De te deixar ficar.
Isso tem um preço e,
Meu amor, eu não mereço..

sábado, 9 de outubro de 2010

PAI(xão) da minha vida

Hoje é um dia comum, como muitos outros em que a saudade não pede licença e invade o meu lar. É um dia em que eu sinto a falta dele, uma saudade que machuca e aperta o peito.

Ahhh... Como eu sinto vontade de abraçá-lo, de beijar aquela careca em início de formação, de deitar com ele na rede e ouvir suas historinhas. Que saudade de almoçar com aquela figura sempre à ponta da mesa, sujando o bigode de suco para me fazer rir, e dizendo à minha mãe o tempo todo que não deixasse faltar nada. Que saudade de comprar sorvete e ir à casa da minha avó escondendo-o só para ele inventar que eu tinha esquecido o sorvete diet dela. Que saudade de chegar em casa e ouvir sempre a mesma pergunta: “Como foi a aulinha hoje?”, e de saber que a ele eu podia contar todas as pequenas coisas do meu dia, porque ele se importava com elas.

Saudade de quando ele chegava de viagem e me trazia de presente um saco de confeitos ou uma caixa de tortuguita. Saudade de ir à padaria comprar pão de mãos dadas a ele, saltitando de alegria. Saudade de entrar no quarto de fininho, enquanto ele assistia a Zorro na TV, e furtar as moedinhas de sua carteira que ficava sempre no mesmo lugar. Saudade de acordar com ele cantando para minha mãe: “Acorda, dona Maria, levanta pra fazer o café, que o dia já está raiando e Hosaninha já está de pé...” E saudade das suas manias engraçadas, de tomar banho ouvindo rádio, e sua loucura de raspar a cabeça e a sobrancelha para um carnaval.

Quanto orgulho eu sentia quando ele ia me deixar na escola... Quão feliz eu fiquei ao ganhar de presente dele um livro de contos de fadas... Quantos sonhos eu tinha ao vê-lo todo vestido de branco e imaginar um futuro igual para mim...

Aquela menina de olhar inocente e cabelinho curto, preso em forma de coqueiro, jamais poderia imaginar o que lhe aconteceria. Jamais poderia imaginar que lhe tirariam seu pai tão precocemente, o homem que tanto a amava e que sentia orgulho da sua pequena. E ele? Quem poderia imaginar que não o deixariam ver o seu “ourinho” crescer?

Lamento muito que ele não possa ter visto o meu cabelo mudar, meu corpo se transformar, meu gosto pela leitura vir à tona por causa de sua influência. Ele não me pôde ver discursar como oradora da turma na formatura, não pôde aplaudir meu sucesso, e não esteve presente para comemorar minha aprovação no vestibular. Pior do que isso, ele nunca vai poder me levar ao altar, se um dia eu vier a casar na igreja.

Infelizmente, nós temos mania de achar que as pessoas que amamos estarão eternamente ao nosso lado e não encaramos a hipótese de perdê-las, tamanha tristeza essa possibilidade nos traz. Deixamos de viver muitas coisas, por achar que temos a vida toda para vivê-las, quando, na verdade, não temos. Deixamos de dizer palavras de afeto, por acreditar que automaticamente as pessoas já sabem o quão importantes são para nós. E eu fico imaginando como seria a minha vida hoje se ele estivesse aqui, o quão meu destino poderia ser diferente. Na verdade, talvez tudo fosse diferente.

Há 13 anos ele se foi, mas muito dele ficou gravado em mim. E, se eu nunca pude dizer o quanto o amava, certamente expressei esse sentimento em cada singelo abraço de criança. O homem que se orgulhava tanto de mim, o homem que me chamava de Ourinho, o homem que me fez sentir vontade de ser alguém, o médico que ajudava às pessoas, independente de quem fosse. Meu pai, meu herói, meu mentor. Sim, ele se foi. Mas o seu legado ficou e, com ele, todo o meu amor.